Androstenediona: Suplemento Nutricional ou Droga Potencialmente Prejudicial?

Muitos atletas utilizam o suplemento “nutricional” obtido sem receita médica, androstenediona (além de norandrostenediol e norandrostenediona, que são transformados no esteróide nandrolona), por acreditarem que estimula a produção de testosterona endógena, permitindo-lhes treinar mais intensamente, aumentar a massa muscular e reparar as lesões mais rapidamente. Encontrada naturalmente nas carnes e nos extratos de algumas plantas, o WWW elogia a androstenediona como “um pró-hormônio, um metabólito afastado apenas uma etapa da biossíntese da testosterona”. A National Football League, a National Collegiate Athletic Association, a Men’s Tennis Association e o COI proibiram sua utilização, pois acham que proporciona uma vantagem competitiva desleal e pode comprometer a saúde, como os esteróides anabólicos. O COI afastou por toda a vida o medalista de ouro do lançamento do peso olímpico de 1996 porque utilizara androstenediona. Atualmente, a Major League Baseball, a National Basketball Association e a National Hockey League não proíbem sua utilização.

Elaborada originalmente pela Alemanha Oriental na década de 1970 para melhorar o desempenho de seus atletas de elite, a androstenediona foi produzida comercialmente pela primeira vez e vendida nos Estados Unidos em 1996. Por denominar a substância como suplemento e evitar quaisquer reivindicações de benefício médico, os regulamentos da FDA de 1994 permitem a comercialização da androstenediona como alimento (800 milhões de dólares em vendas anuais na Internet e sem receita médica). Levando-se em conta que muitos países consideram a androstenediona uma substância controlada, os atletas internacionais viajam aos Estados Unidos para comprar o composto, contribuindo ainda mais para as vendas anuais totais superiores a 15 bilhões de dólares da indústria desse suplemento. Atualmente, são disponíveis uma goma de mascar que contém androstenediona e uma pastilha· do esteróide que se dissolve debaixo da língua.

A androstenediona é um hormônio intermediário (precursor) entre DHEA e testosterona, que ajuda o fígado na síntese de outros hormônios esteróides biologicamente ativos. É produzida normalmente pelas glândulas supra-renais e gônadas, sendo transformada para testosterona enzimaticamente pela 17B-desoxiesteróide desidrogenase encontrada em diversos tecidos do corpo. A androstenediona é também um precursor estrogênico.

Existe pouca evidência científica em apoio das reivindicações da eficácia da androstenediona ou de suas qualidades anabólicas. Até agora, apenas um estudo avaliou sistematicamente se a suplementação com androstenediona oral a curto e a longo prazos eleva as concentrações sangüíneas de testosterona ou aprimora os aumentos no tamanho e na força dos músculos durante o treinamento de resistência. 139 Em uma fase da pesquisa, 10 homens adultos jovens receberam uma única dose de 100 mg de androstenediona, ou um placebo contendo 250 mg de farinha de arroz. A Fig. 23.4A mostra que o nível sérico de androstenediona aumentou 175% durante os primeiros 60 minutos após a ingestão e, a seguir, subiu ainda mais, para cerca de 350% acima dos valores basais entre os minutos 90 e 270. Entretanto, a suplementação a curto prazo com androstenediona não afetava as concentrações séricas de testosterona tanto livre quanto total. Na segunda fase da experiência, 20 homens jovens e destreinados receberam 300 mg de androstenediona diariamente (n = 10), ou 250 mg de um placebo contendo farinha de arroz diariamente durante as semanas 1,2,4,5,7 e 8 de um programa de treinamento de resistência corporal total com duração de oito semanas.

Os níveis séricos de androstenediona aumentaram 100% no grupo suplementado com androstenediona e permaneceram elevados durante todo o período de treinamento. Apesar de os níveis séricos de testosterona (Fig. 23.4B) terem permanecido muito mais altos no grupo suplementado com androstenediona que no grupo placebo antes e após a suplementação, os níveis livres e totais de testosterona no soro se mantiveram inalterados para ambos os grupos como resultado do período com suplementação-treinamento. Entretanto, as concentrações séricas de estradiol e de estrona aumentaram de maneira significativa somente durante o treinamento para o grupo que recebera o suplemento, sugerindo uma maior aromatização da androstenediona ingerida para estrogênios (Fig. 23.4C). Ainda mais, apesar de o treinamento com resistência ter acarretado um aumento significativo na força muscular e na massa corporal magra e ter reduzido a gordura corporal para ambos os grupos, não foram observados efeitos sinergísticos para o grupo suplementado com androstenediona. No entanto, o suplemento acarretou uma redução de 12% (significativa) de HDL-C após apenas duas semanas, que se manteve mais baixo durante as oito semanas de treinamento e suplementação. As concentrações séricas das enzimas hepáticas permaneceram dentro dos limites normais para ambos os grupos em todo o período experimental.

Em conjunto, esses achados indicam que não houve qualquer efeito da suplementação com androstrenediona sobre: (1) as concentrações séricas basais de testosterona ou (2) a resposta ao treinamento em termos de tamanho e força dos músculos e de composição corporal. São preocupantes os efeitos negativos potencialmente significativos da redução do HDL-C sobre o risco global de doença cardíaca e dos níveis séricos elevados de estrogênio sobre o risco de ginecomastia e, possivelmente, de cânceres pancreáticos e de outros órgãos. Esses achados devem ser encarados dentro do contexto desse estudo específico, pois os indivíduos testados tomaram doses muito menores de androstenediona que aquelas ingeridas sistematicamente por fisiculturistas e outros atletas.

Foram formuladas questões acerca do uso legal de androstenediona por jogadores profissionais de beisebol durante a temporada de 1998 em sua tentativa de quebrar os recordes sem interrupção (home run) de Babe Ruth e Roger Maris. Os problemas relacionados ao desporto concentraram-se em: (1) se a suplementação causa aumentos significativos na força e potência musculares e (2) se algum aumento na aptidão é transferido realmente para um melhor desempenho nas diversas habilidades motoras precisas necessárias no beisebol, no basquete, no hóquei sobre o gelo e de campo, no futebol e no golfe. Se ocorrem de fato efeitos positivos, nesse caso os cientistas poderão avaliar objetivamente todos os aprimoramentos nessas tarefas. Pelo que sabemos, nenhuma evidência confiável demonstra esses benefícios específicos para cada desporto. Estudos adicionais em grupos maiores de homens e mulheres por períodos mais longos terão que determinar qual é a posologia, se existe alguma, capaz de elevar a testosterona até níveis suficientemente altos por um período de tempo suficientemente longo a ponto de proporcionar efeitos ergogênicos, e se essa utilização causa algum prejuízo. Atualmente, alguns atletas realizam a suplementação com uma dose diária de androstrenediona na variação de 500 a 1.200 mg.

Os Atletas Competitivos Devem Tomar Cuidado

A pesquisa recente desperta preocupação entre os atletas de elite de que o uso de androstenediona possa gerar confusão em um exame de urina para o esteróide anaoólico proibido nandrolona. Isso ocorre porque o suplemento contém com freqüência contaminação com quantidades minúsculas do metabólito 19-norandrosterona, o marcador padronizado que assinala o uso de nandrolona. Muitas marcas de preparados de androstenediona são muito precariamente rotuladas. A análise de nove marcas diferentes com doses de 100 mg também indica amplas flutuações no conteúdo global que oscila de zero a 103 mg de androstenediona, com uma marca contendo também testosterona.

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