Como alguem se torna anoréxico?

Esse grave distúrbio do comportamento alimentar afeta os jovens e mais particularmente as moças. Começa, em geral, com um regime que evolui para uma restrição voluntária. O prazer de comer é substituído pelo prazer de resistir, o que O. Kestemberg chama de “orgasmo da fome” (Ia faim et le carps – A fome e o corpo, 1972).

Estima-se que, na França, de 1 a 4% das jovens universitárias sejam anoréticas (7,6% das bailarinas).

Considera-se que há entre 3 mil e 6 mil novos casos por ano.

Mas alguns pensam que essas cifras estão largamente subestimadas, por causa do diagnóstico tardio que caracteriza esse distúrbio. As moças (e mais raramente os rapazes) escondem habilmente dos que os cercam seu transtorno alimentar e sua magreza.

Critérios permitem estabelecer um diagnóstico de anorexia mental:

  • Ausência de fome ou saciedade muito rápida no momento da refeição.
  • Inibição frente ao consumo alimentar.
  • Recusa em manter o próprio peso acima do mínimo requerido em relação à altura.
  • Perda de peso de pelo menos 25% do peso inicial.
  • Medo intenso de ganhar peso ou tornar-se “gordo/à’, ainda que seu peso seja inferior ao normal.
  • Alteração da imagem corporal, com sensação de estar gordo/a demais, quando, na verdade, a pessoa está adequada.
  • Negação da gravidade da magreza real.
  • Amenorréia (ausência de menstruação) nas moças já púberes.
  • Recusa de um corpo de mulher nas jovens.
  • Inexistência de qualquer doença que explique a perda de peso.

Se a jovem, diante da evidência de seu emagrecimento, recusase a atingir um peso mesmo mínimo ou a ganhar os dez quilos que a fariam voltar a um peso “normal”, pode-se dizer que o diagnóstico é indiscutível.

Conforme as complicações associadas, vai-se diagnosticar uma anorexia mais ou menos grave. As complicações possíveis são:

Desnutrição, que leva a uma perda muscular generalizada (inclusive do músculo cardíaco), e também refluxo gastroesofágico e constipação intestinal.
Taxa baixa de potássio sangüíneo (“hipocalemià’ ligada aos vômitos), que pode induzir alterações de ritmo cardíaco.

  • Fragilização do tecido ósseo (ligada à amenorréia).
  • Baixa fertilidade.
  • Pressão arterial baixa.
  • Edemas (causa de erros na avaliação do peso; surgem quando o IMC for inferior a 15%).

Essas complicações e sintomas associados às vezes não são logo identificados no início da anorexia. Em contrapartida, quando aparecem (taxa baixa de albumina, de hemoglobina, de potássio, de ferro ou de cálcio no sangue), significam que a doença já atingiu um estágio avançado.

A perda de peso torna seguras pessoas inseguras. O jejum estimula os hormônios do estresse e acentua a vigilância; as refeições, ao contrário, parecem-lhes causa de fraqueza e de sonolência. Privandose de comer, o anoréxico tem, então, a impressão de dominar seu meio ambiente.

Quando se tenta desenhar um quadro psicológico reunindo os traços comuns dos anoréxicos, descobre-se uma personalidade complexa: a anorexia familiar poderia ocorrer numa família “muito calma”, onde todo conflito é evitado, onde não se exprime emoções.

A jovem, que não pode viver normalmente sua crise de adolescência, não consegue opor-se à própria mãe como se esperaria nessa etapa da vida; então, o que ela rejeita é a comida, quer como um símbolo de sua mãe-nutriz quer como autodepreciação. A jovem anorética geralmente vive mal sua puberdade porque recusa as transformações merentes.

Sem confiança em si, ela recusa (e é obcecada por) tudo o que é “natural”, instintivo, seja a sexualidade, seja a fome. Privando-se de alimentos, ela tem a impressão de dominar seus instintos, seu corpo e o mundo que a cerca. O encantamento que ela sente por ser todo-poderosa é tamanho que ela até desconsidera o risco de morte.

Trata-se geralmente de uma jovem inteligente, na qual pode-se perceber um certo espírito competitivo. Apesar de uma personalidade brilhante, costuma ter poucos contatos sociais.

É muito difícil ajudar o anoréxico. Seu comportamento parece pedir “ajudem-me”. Mas o controle absoluto que ele crê exercer sobre si mesmo promove-lhe prazer. E faz com que, na verdade, ele pense:

“Eu não deixarei que me ajudem”. É uma conduta verdadeiramente autodestrutiva.

Podemos distinguir dois tipos de anorexia, uma tão grave quanto a outra: a anorexia mental restritiva pura e a anorexia-bulimia, que alternam episódios anoréxicos e bulímicos.

Ambas podem ser mortais. Não devemos, portanto, subestimar sua gravidade. Ao cabo de dez anos de evolução da doença, 50% das jovens afetadas são consideradas curadas, mas de 20 a 25% são apenas parcialmente curadas; 20% permanecem anoréticas e 5% das anoréticas restritivas e 10% das anoréticas-bulímicas falecem.

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